A operação de maior impacto já feita pela Polícia Federal a atingir a Justiça brasileira não nasceu como Hurricane, furacão em inglês. Seu primeiro nome era genuinamente nacional: Furacão, sem nenhum estrangeirismo. A versão para o inglês foi um procedimento de segurança motivado por uma suspeita de vazamento de informações antes que a operação fosse desencadeada. Esse não foi o único cuidado inédito na fase de preparação. Toda a ação foi desenvolvida à revelia da Superintendência da PF no Rio de Janeiro. A única parceria na cidade foi com o Exército, que ajudou na logística. Razão para tamanho cuidado: ações anteriores na cidade não alcançaram os resultados esperados porque os alvos souberam de antemão o que fariam os investigadores.
Desta vez deu certo. Na sexta-feira 13, a PF prendeu 25 pessoas e cumpriu 70 mandados de busca e apreensão - carros, dinheiro, jóias e mais de 1 tonelada de documentos. Pela primeira vez, desembargadores federais foram presos, acusados de venda de sentenças judiciais para favorecer o crime organizado. Com eles, foram detidos advogados, policiais e banqueiros do jogo do bicho. Entre os suspeitos está o ministro do Superior Tribunal de Justiça Paulo Medina. A Polícia Federal pediu a prisão de Medina, mas ela não foi autorizada pelo Supremo Tribunal Federal.
A ação começou na quarta-feira 11, quando agentes de Porto Alegre, Santa Catarina, Distrito Federal e Paraná foram avisados de que iriam trabalhar em mais uma operação. Num procedimento incomum, eles não foram informados do destino ou da natureza da missão. No dia seguinte, foram deslocados para Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia.
O maior contingente foi para o Rio - 382 delegados e agentes desembarcaram na cidade num jato EBM-145, da Polícia Federal, e num Hércules, da Força Aérea Brasileira. Saíram dos aviões, entraram em ônibus alugados e seguiram até um quartel do Exército na zona sul. Foi a primeira vez em que se usou uma instalação militar para hospedar policiais federais numa operação especial. Com exceção dos 45 agentes do Departamento de Inteligência, ninguém tinha detalhes sobre a missão. Os celulares foram desligados. Todos os agentes estavam proibidos de usar a internet. Foram alugados 94 carros, seis ônibus e quatro carros-fortes. Também pela primeira vez, cem aparelhos de orientação por satélite (GPS) foram alugados para que os agentes de outros Estados pudessem localizar endereços no Rio. "Não pudemos contar com os policiais do Rio. Por isso tivemos de inovar nesse caso", afirma um dos investigadores.
Todos os veículos e os aparelhos de orientação por satélite foram alugados pelo Exército com dinheiro da Polícia Federal. Ao todo, R$ 130 mil foram investidos na logística da Operação Hurricane. Na noite da quinta-feira, os agentes dormiram cedo. Na madrugada seguinte, foram acordados às 3 horas da manhã para cumprir os mandados de prisão e de busca e apreensão. Em operações convencionais, há uma preleção para todos. Desta vez, os 382 policiais foram divididos em 68 equipes. Cada grupo recebeu as chaves de um carro, a ficha dos suspeitos e as instruções. Nada mais. Uma equipe não tinha informações sobre o que a outra iria fazer. Apenas os delegados e agentes da Inteligência conheciam todos os alvos.
Os agentes deixaram o quartel entre 4h10 e 5h30. Antes receberam um lanche reforçado, com barras de cereais, bebida à base de guaraná em pó, sanduíche e frutas. Nos carros, o GPS orientava os policiais. "Ao apertar um botão, eles obtinham o trajeto com a distância e a estimativa do tempo que levam até o alvo", diz um delegado. "Após concluir a missão, eles apertaram outro botão que mostrava o caminho para a Superintendência da PF no Rio." Outra novidade: todas as conversas feitas por meio dos radiocomunicadores das equipes que realizaram as prisões foram criptografadas. Um aparelho móvel era responsável por codificar os informes.
Só aí os carros da polícia foram usados para levar os presos e o dinheiro apreendido, cerca de R$ 16 milhões. Os detidos na Operação Hurricane ainda contaram com uma UTI móvel. Seis presos tiveram atendimento médico. Um deles foi o desembargador federal José Eduardo Carreira Alvim, que sofreu uma leve taquicardia.
Desde que foi descoberto o envolvimento de juízes, cerca de dez agentes da PF em Brasília se revezaram em viagens sigilosas para o Rio. Lá instalaram escutas telefônicas e nos ambientes e seguiram suspeitos. Eles prestavam contas da apuração apenas à chefia em Brasília, ao procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, e ao ministro Cezar Peluso, do Supremo Tribunal Federal.
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